Atacada por todos os lados, a 28ª Bienal Internacional de São Paulo, que termina neste sábado (6), recebeu em seus últimos dias de exposição um elogio improvável: veio de dentro de uma penitenciária. "Acho interessante. Me identifico um pouco com o vazio", disse à Folha Online a pichadora gaúcha Caroline Pivetta da Mota, 23, (ou Caroline Sustos, como assina seus autos de prisão).
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Caroline Pivetta fala sobre pichação na Bienal parte 1
Caroline foi uma das 40 pessoas que, no dia 26 de outubro, atacou com spray o prédio da Bienal, no parque Ibirapuera. Ela está encarcerada há 40 dias. Dependendo do julgamento, pode permanecer na Penitenciária Feminina de Santana, onde a reportagem a entrevistou, até a próxima Bienal, em 2010.
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Caroline e outros dois jovens picham as paredes do prédio da Bienal, projetado pelo arquiteto Oscar Niemeyer |
Enquadrada no artigo 62 da Lei do Meio Ambiente (destruição de patrimônio cultural), pode pegar de um a três anos de prisão. Caroline estava nos ataques à piche na galeria Choque Cultural, em Pinheiros, e no Centro Universitário Belas Artes --ela também responde processo por este último.
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A 28ª Bienal Internacional de São Paulo acaba neste sábado, mas a pichadora Caroline continua presa por pintar a exposição do vazio |
Na Bienal, não havia integrantes de apenas um grupo, segundo ela. "Cada um 'colou' lá por um motivo", explica. O dela? "Estava me manifestando contra os desfavorecidos, os que não tem acesso àquela coisa toda [a arte da Bienal]." E emenda: "Claro que eu não precisava me expor dessa forma. Fui lá pela manifestação, para acompanhar os meninos, não pelo Susto"s. Se tivesse me privado daquilo, estaria hoje na rua fazendo o que gosto, que é pichar."
Ela diz que aprova a temática da Bienal, porque "todo mundo tem um vazio dentro de si". "Tanto na Bienal, quanto na Belas Artes, fui só para ver o que ia rolar. Mas, quando percebi, a lata de spray já estava na minha mão", diz, rindo de si mesma.
Na exposição, foi preso ainda o taxista Rafael Vieira Camargo Martins, 27, também do Susto"s. Ele vai responder ao processo em liberdade e alega ter apenas seguido o ato como espectador.
Caroline Pivetta fala sobre pichação na Bienal parte 3
Meta de vida
Arquivo Pessoal Caroline Pivetta da Mota, 23, aponta uma de suas pichações favoritas na capital paulista "Tanto grafite, quanto picho são underground, coisa do fundão. Não são feitos para exposição em galeria. A parada que eu faço é na rua, é para o povo olhar e não gostar. Uma agressão visual", diz Caroline, que ouve bandas de reggae e de Oi! (gênero cujos apreciadores vão de punks a skinheads antifascistas). Ela conta que já foi espancada por anarco-punks em Porto Alegre e que um de seus melhores amigos acabou morto em uma briga de rua.
A jovem cursou até o primeiro ano do ensino médio. Largou os estudos após tentar se suicidar, um dos poucos assuntos sobre o qual prefere não falar. Já trabalhou como atendente de telemarketing e, antes de transformar a pichação numa "meta na vida", vendia artesanato e camisetas na rua. Sua mãe, a artesã Rosemari Pivetta da Mota, viajou do Rio Grande do Sul a São Paulo nesta semana --Caroline não foi criada pelo pai.
Na prisão, a pichadora está dividindo a cela com uma evangélica. "Tenho que ficar assistindo ao canal da igreja", brinca. Vegetariana, lamenta ter que comer carne, porque "tem dias que não tem como encarar esse arroz e feijão daqui".
Na semana passada, ganhou uma pichação no próprio corpo: tatuou Susto"s no antebraço direito.
Caroline Pivetta fala sobre pichação na Bienal parte 2
Pressão
Antes da Bienal e da galeria Choque Cultural, a jovem só havia entrado em uma exposição na vida, sobre o artista espanhol Joan Miró (1893-1983). "Achei bem louco", diz, sobre a mostra do Santander Cultural de Porto Alegre.
De acordo com os advogados de Caroline, ela não conseguiu comprovar residência fixa, tampouco ocupação legal, por isso permanece presa. Eles dizem que farão mais um pedido à Justiça para que a jovem responda em liberdade.
A Bienal nega fazer pressão para mantê-la atrás das grades, embora os advogados da instituição dêem como certa a condenação dos jovens. Diversos artistas cobram a fundação para liberá-la.
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Pichadores fazem protesto em muros da Barra Funda (zona norte de São Paulo), pedindo a libertação de Caroline Pivetta da Mota |
"A Bienal dizia ser um espaço interativo. Rolou de algumas pessoas entrarem lá para discutir arte contemporânea. O cara que ficou pelado [Maurício Ianês] estava integrado com o sistema, para a gente não é assim. A arte tem que ser livre", diz o pichador Rafael Guedes Augustaitiz, o Pixobomb, líder das ações. Foi ele quem, em junho passado, apresentou como TCC (trabalho de conclusão de curso) um ataque de spray a sua faculdade.
"A gente não queria estragar as obras deles [da Bienal], mesmo porque não tinha obra. A obra, ali, nós que íamos fazer", diz Caroline. Embora seja chamada informalmente de Bienal do Vazio, o título oficial da mostra é "Em Vivo Contato".
Autor: DIÓGENES MUNIZ editor de Informática da Folha Online
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