Ah, esqueci de dizer que, dentre os 70 blogs páginas que compõem esta obra apenas a de número 66 não será atualizada
( ) Em branco
Eternamente em branco, de forma que esta obra é composta por 69 páginas mas o rosto capa spin túnel, ah como estou feliz
Vale a partir de agora
Hoje é o meu primeiro dia neste planeta como Godot
Godot voltou:
Análise da Obra Esperando Godot (Samuel Beckett) - por Mari Santoro
Assim como Goethe, Samuel Becket é um dos meus escritores favoritos. Sua obra é impactante e logo de início causa sentimentos opostos em seus leitores; hás os que se encantam e se identificam com a obra e há os que criam verdadeira aversão a este tipo de leitura . A peça Esperando Godot é a que mais me instiga a refletir e por isso gostaria de falar um pouco sobre ela aqui no blog...
Com
recursos metateatrais, Godot revolucionou a dramaturgia do século
XX por representar cenicamente a poética da negação e da redução e por
apresentar o universo árido e inóspito da narrativa beckettiana nos
palcos teatrais.
Espetáculo impactante,
original e extraordinário que chega ao centro da culpa, da desesperança e do
desconforto do homem altamente “civilizado”, que se ocupa em realizar ações
inúteis e permanecer na mesma indolência e imobilidade de sempre. Beckett
expressou claramente e poeticamente o vazio que cerca e assombra o ser humano e
sua obra tornou-se um importante meio de reflexão sobre os valores existenciais
do homem moderno.
APRESENTAÇÃO DA OBRA:
Esperando Godot - Dir. Gabriel Vilela- Teatro Sesc Paulista (2006)
“Estragon:
estamos sempre achando alguma coisa, não é, Didi, para dar a impressão de que
existimos?”
(Beckett em Esperando
Godot)
Uma peça dessa natureza
provoca as mais diversas tentativas de compreensão pois age em torno da espera e
da negação; processo árduo e inútil. As repetições dos gestos e dos diálogos
apresentados em cena reforçam a angústia e o desespero do homem ao levar uma
vida insignificante e ao esperar permanentemente por algo incerto, porém
essencial para a sua sobrevivência.
Esperando Godot,
paradoxalmente, não é uma obra cômica e nem trágica e ao mesmo tempo é. Por este
motivo é praticamente impossível qualificá-la.
O autor utiliza-se do humor
para atrair a atenção do leitor para uma obra que trata do sofrimento e da
degradação humana de forma tão explicita e poética.
“O riso é o riso da
crueldade”
(Personagem What– em What –obra de
Samuel Beckett)
Por acreditar que não se
pode expressar racionalmente aquilo que é ilógico, o autor não faz uso do
discurso racional e vale-se da expressão corporal de suas personagens para
expressar a intenção de seu texto.
“Godot é uma parábola
expressa como grande tributo ao poder do teatro, das artes cênicas. O texto é um
exercício metafísico de reflexão sobre o ser empreendido por personagens que têm
séculos de saudável irresponsabilidade: os palhaços de circo, com suas duplas de
clown – Didio e Gogô, Pozzo e Lucky-, Beckett remete o espectador ao mesmo tempo
para a filosofia e para o antigo teatro de variedades europeu, o circo, o teatro
de revista. Sem a inclusão desse humor a peça seria mais que pessimista
intolerável.”
(Alberto Guzik)
Obra impactante, que
espelha a trágica condição humana e que, por meio de uma linguagem cômica,
expressa à dor profunda, o desespero contido, a tensão constante e angústia
eminente a todos os seres humanos que se sentem incapazes e imobilizados diante
da vida e que conscientes de sua condição existencial praticam ações inúteis
apenas para passar o tempo enquanto esperam pelo enredo final, a
morte.
CONTEXTO
HISTÓRICO:
A peça teatral Esperando
Godot foi escrita no pós- guerra (1946/53), numa época em que as certezas e
as crenças dos períodos anteriores haviam desaparecido por completo. Tudo que
direcionava a sociedade anterior, bem como todos os paradigmas haviam perdido a
credibilidade e homem encontrava-se perdido num mundo sem direção e repleto de
questionamentos diante da vida.
A conseqüência trazida pelo
terror do holocausto fez com que os escritores passassem a questionar sobre o
modo de escrever sobre o ser humano. O homem tornara-se “inominável” e
indecifrável.
A sociedade não acreditava
mais em Deus e se questionava sobre o sentido da existência humana. A fé
religiosa entrou em declínio e foi substituída pelas incertezas de um futuro
promissor, dos valores norteadores das ações humanas, dos ideais e da ética que
o homem deveria seguir.
O
mundo moderno estava em constante transformação. O nacionalismo foi dilacerado
pela guerra e o homem passou a se sentir um estranho diante de tantas
desilusões.
Houve
uma espécie de divórcio entre o homem e sua vida; entre o ator e o seu cenário.
A sociedade foi privada da lembrança de uma pátria perdida e se viu descrente
diante de tantos acontecimentos dolorosos e sanguinários. Os sentimentos do
absurdo surgiram nas relações humanas modernas e foram representados nos palcos
teatrais por meio dos textos de autores como Samuel
Beckett.
A
racionalidade humana havia desenvolvido os atos mais sórdidos e cruéis na luta
pelo poder. Depois da tragédia causada pela guerra e pelo nazismo a sociedade
não encontrava mais uma visão coerente da realidade que pudesse nortear as ações
humanas.
TEMA:
O tema é a espera por Godot; a espera da
morte e do nada. Para o autor a espera é o nosso estado natural, pois já
nascemos condenados a morrer.
A obra é uma reflexão sobre
a condição humana e trata de assuntos como o abandono, a solidão e o medo da
extinção.
Estragon:
(...) Vamo-nos embora daqui.
Vladimir:
Não podemos.
Estragon:
Por quê?
Vladimir:
Estamos à espera de Godot
Estragon:
Ah, é verdade! (...)
(Vladimir e
Estragon em Esperando Godot)
NARRATIVA:
Em Esperando Godot,
ao contrário do texto do teatro tradicional, não há um enredo linear,
com começo, meio e fim; em que a ação possa progredir
gradualmente.
A narrativa gira em torno
de Vladimir e Estragon, dois mendigos caracterizados pela
indolência e pelos gestos infantilizados, que estão sempre a esperar por
Godot sob uma árvore à beira da estrada. Enquanto aguardam pelo
misterioso Godot conhecem outra dupla de vagabundos, Pozzo e Lucky
e recebem um mensageiro que sempre traz a notícia de que Godot
não virá.
Vladimir e
Estragon representam uma série de cenas cômicas, com diálogos
incoerentes, jogos de linguagens e gestos circenses, apenas para passar o
tempo.Nos dois atos da peça as personagens apresentam gestos, ações e perguntas
repetitivas e esperam por algo que jamais chega, sem ter exatamente a certeza do
que estão esperando.
O segundo ato é
praticamente uma repetição do primeiro e apresenta episódios semelhantes como à
surra de Estragon, o encontro com Pozzo e Lucky, o diálogo
com o menino mensageiro, entre outros; todos com algumas alterações cênicas, mas
com a mesma essência.
É importante observar que
os dois atos da peça terminam da mesma forma; mais um dia que se foi
inutilmente, Godot não apareceu e os mendigos Vladimir e
Estragon pensam em partir:
Vladimir:
Então, vamos embora?
Estragon:
Vamos.
(Vladimir e Estragon em Esperando
Godot)
A narrativa sempre segue
com a repetição do mesmo dia e com a incapacidade que seus personagens possuem
de se localizar dentro do tempo e do espaço. Sem história e sem identidade, seus
personagens estão à mercê da vida e a espera de uma possível
salvação.
Perdem a localização
espacial, já que os pontos de referência que dispõem como a árvore e a estrada
são incertos tanto quanto o sentido de direção que lhes falta e que os obriga a
simplesmente permanecer e esperar; as personagens não são atuantes em sua
própria história.
A ação que motiva a cena
vem da espera dos vagabundos Estragon e Vladimir pelo misterioso
personagem Godot, que nunca aparece, mas que representa a esperança, a
salvação e liberdade destes dois mendigos que encontram-se desesperados e
impotentes diante de uma vida sem rumo e insignificante.
Esperando Godot - Dir. Gabriel Vilela- Teatro Sesc Paulista (2006)
CARACTERÍSTICAS
PRINCIPAIS DA OBRA:
Toda
a ação se desenvolve em torno de uma situação estática determinada: dois homens,
sentados lado a lado, em silêncio (ou trocando palavras vazias), impregnados
pela solidão e escravizados por uma rotina angustiante - situação que se
desestabiliza no instante em que a dor de uma ausência é
revelada.
Os
críticos teatrais dizem que se trata de um “anti-peça”, pois nela nada acontece.
É um teatro sem ação, repetitivo e linear.
É uma
obra essencialmente trágica, que trata da sensibilidade do absurdo de uma forma
cômica e original.
Nesta
obra estão presentes as principais características da criação literária de
Beckett; a imobilidade, a degradação física, a imprecisão histórica e
espacial, a reflexão sobre a condição humana e a falta de sentido lógico na
sucessão de eventos irrelevantes.
Porém, por se tratar de uma
peça teatral, Esperando Godot se diferencia das demais obras literárias
beckettianas porque a presença física do ator exige a representação
concreta do texto e impossibilita a reflexão abstrata de um narrador indagativo
que se auto-questione.
As
personagens expressam fisicamente o absurdo de sua condição existência, por meio
de uma série de atos banais e de diálogos e perguntas incoerentes e sem
respostas concretas.
Por
meio do humor caricato e de recursos circenses o autor apresenta a tragédia
humana e parodia a expectativa do público que espera ser surpreendido por um
acontecimento especial. Os atores estão imersos em uma encenação que expressam
sentimentos de tédio e de angústia, causados pela ausência de acontecimentos e
pela imobilidade e degradação das personagens, que esperam por algo incerto; o
“ausente e presente” Godot.
Qualquer certeza na obra
beckettiana é imediatamente relativizada.
O
texto de Esperando Godot é repleto de gestos e movimentos repetitivos, de
perguntas excessivas, de diálogos sem sentido aparente, de total imobilidade e
falta de objetivo por parte das angustiadas e entediadas personagens que não
encontram saída para o seu sofrimento e apenas esperam por algo que não sabem
exatamente o que é.
Os movimentos cíclicos são
apresentados em diversos episódios da peça, como um refrão que se faz ouvir por
diversas vezes, como as trocas de chapéus entre Didi e Gogo, a maneira como olham
insistentemente dentro de seus chapéus, como se tivessem buscando algo, entre
outros.
PERSONAGENS:
Vladimir – mendigo
Estragon- mendigo
Lucky – servo
Pozzo – senhor
Mensageiro – traz notícias sobre
Godot
Godot – personagem ausente
As personagens beckettianas são a antítese do herói burguês
ativo e próspero. Sem objetivos definidos vivem uma sucessão de acontecimentos
banais que não contribuem em nada para o seu progresso e
desenvolvimento.
GODOT:
Eruditos e acadêmicos
procuram decifrar o mistério criado propositalmente por Beckett para a
personagem Godot. Especula-se que o nome Godot seria composto de
uma aglutinação do substantivo inglês “God” (Deus) com o sufixo
diminutivo em francês ”ot” (geralmente empregado em diminutivos
carinhosos como, por exemplo, Charlot).
Esta
personagem também já foi interpretada como sendo a Liberdade, a Morte ou até
mesmo uma alusão à Godeau, personagem de Balzac. O que vale
ressaltar é que independe das interpretações dadas à esta personagem, Godot
jamais pode ser uma certeza; não se trata de um enigma a ser
desvendado.
Beckett
foi incisivo quando indagado sobre o significado de
Godot:
“Se eu
soubesse, o teria dito na peça”
(Samuel Beckett)
Exerce uma função
importante na obra que é a de fazer esperar; ao longo da obra as personagens
Didi e Gogô dizem, por treze vezes, que esperam por
Godot. É essa espera que dá sentido
a vida desses dois mendigos, que apenas sobrevivem em meio ao tédio ao abandono
e depositam em Godot
a esperança da
salvação deste mundo cruel e hostil a que estão
destinados.
Godot é a personagem
sempre esperada da obra, mas que nunca aparece; é uma ausência presente
(elemento frequentemente encontrado na obra de Beckett). Esta misteriosa
personagem também representa o desespero de uma vida sem sentido, incerta e sem
direção.
Por uma triste ironia da vida, a
consagrada atriz brasileira Cacilda Becker sofreu um derrame cerebral
enquanto encenava, ao lado de seu marido Walmor Chagas, a peça Esperando Godot e foi levada, ainda com o
figurino da personagem, para o hospital. Faleceu após trinta e oito dias em
coma; o que intrigou ainda mais o público que não pode deixar de comparar a
espera da personagem por Godot com a infeliz morte de
atriz.
ANÁLISE DAS PERSONAGENS:
São incapazes de
um diálogo coerente e de defender teorias, uma vez que a frágil memória, sempre
prejudica o fluxo da conversação e da reflexão. Vladimir, aparentemente o
mais forte da dupla, não responde às perguntas de Estragon, simplesmente
porque não sabe como fazê-lo.
Apesar da espera ser o fator motivacional de suas vidas, Vladimir e
Estragon se quer possuem a certeza e a definição do que realmente
esperam; Vladimir chega mesmo a se questionar se Pozzo, ao entrar
em cena, não seria Godot. As personagens beckettianas são seres
abandonados pela vida e que sempre se interrogam sobre sua condição social e
existencial.
O
mendigo não tem objetivo e por isso o tempo para ele não existe. Não cria
identidade com o universo em que vive, perde a noção de contexto e de espaço.
Beckett humaniza o sofrimento do mendigo e mergulha nesse personagem tão
sofredor, simultaneamente de forma trágica e cômica.
Todas
as suas personagens têm dificuldade de locomoção, o que funciona como uma
metáfora para a incapacidade que possuem de estabelecer objetivos, de tomar
atitudes e de alcançar a prosperidade que transformaria suas vidas. É também
impossível descrever fisicamente seus personagens; apenas sabemos que possuem
alguma incapacidade física.
Estão perdidos num mundo
hostil, monótono e solitário. Procuram sempre algo para matar o tédio e os
distrair da tristeza e da angústia que sentem por terem a consciência do quanto
são impotentes diante da vida.
“Nada a
fazer”
(Vladimir em Esperando Godot)
As
personagens não se desenvolvem ao longo da peça. Fazem sempre as mesmas
perguntas, comentem os mesmos erros e repetem discussões passadas. Não aprendem,
não progridem, não evoluem e também não se comunicam.
Embora estejam juntos e
necessitem desesperadamente da companhia um do outro para que não fiquem na
completa solidão, Vladimir e Estragon, assim como a dupla
Pozzo e Lucky, falam o tempo todo, mas jamais se comunicam e
carregam uma permanente tensão entre si encoberta pelo riso; o riso e os gestos
clownenses brilhantemente utilizados por Beckett, para representar
esse desespero contido.
O
autor trabalha com a questão do duplo: a dupla de mendigos Vladimir e
Estragon e dupla Pozzo e Lucky. Este último par ilustra
claramente a relação de dependência mútua que possuem (um diverte o outro e
ajuda a passar o tempo enfadonho) e a questão dos dois temperamentos distintos
que se complementam; estão fisicamente ligados por uma corda, são senhor e
escravo respectivamente e embora Pozzo se mostre superior ao seu servo
Lucky, não fica muito bem definido quem direciona essa relação. Além de
cego e de necessitar de seu servo para se locomover, Pozzo é egocêntrico
e necessita de Lucky para afirmar sua superioridade.
Percebemos um constante
descompasso entre o passado e o presente das personagens; entre o que poderia
ter sido e não é. Não possuem memória, portanto o passado não existe e não pode
ensiná-los de seus erros. Sendo assim não evoluem, não agem e permanecem numa
inércia constante. Também como não se comunicam, não conseguem refletir juntos e
sair desta trágica situação.
São inertes ä sua condição e
incapazes de agir decisivamente; também não morrem simplesmente ou desistem;
nada fazem! Em tentativas patéticas de passar o tempo e presos numa repetição
continua, se entregam a vida e agem como atores que encenam diariamente os
mesmos espetáculos e cometendo sempre os mesmos erros em cena.
“Em Godot, afirma Robbe-Grillet,
os personagens estão cerceados numa liberdade fundamental: eles não podem se
ausentar do palco- é o trágico être-là; presenças permanentes,
irremediáveis”.
(Fernando Peixoto – em
Godot chegou para Beckett)
Mesmo
com a opção de fugir, Vladimir e Estragon não o fazem, pois estão imersos
em sua comodidade e são incapazes alguns episódios como, por exemplo, o da dança
e o do discurso de Lucky, como o da discussão de tomar qualquer atitude
válida. Suas vidas apresentam um caráter artificial, reforçado entre
Vladimir e Estragon ou como os das imitações banais de Pozzo
e Lucky, entre outros.
Não
compreendem o que está além de sua atuação e não são plenamente conscientes.
Jamais se revoltam; são seres passivos e acomodados.
O AUTOR
SAMUEL BECKETT:
O irlandês Samuel
Beckett é o protótipo do escritor múltiplo, que sempre busca a inovação e
destrói as fronteiras artísticas. Anti-realista compôs romances, novelas, peças
de teatro, textos em prosa, ensaios, poemas, roteiro de cinema, críticas sobre
pintura, traduções e textos radiofônicos.
Nascido em 1906, em Foxrock,
subúrbio abastado de Dublin iniciou sua carreira literária em 1930, com
poemas e ensaios (um deles o poema Whoroscope, título composto pelas
palavras prostitua e horóscopo). No ano seguinte escreve um ensaio sobre
Marcel Proust.
Á partir de 1937 muda-se
para Paris, onde participa da Resistência Francesa à Segunda Guerra Mundial. Em
1938 escreve, em inglês, seu primeiro romance, Murphy, que foi traduzido
por ele para o francês, em 1947. Beckett construiu uma carreira bilíngüe,
com obras escritas em inglês e em francês.
Na juventude foi secretário
pessoal de James Joyce. Mais tarde afastou-se de Joyce para desenvolver
seu próprio estilo literário; ao contrário dos textos de Joyce, a
obra beckettiana trabalha com a redução da palavra. Beckett passou
a escrever seus textos em francês, língua a qual não possuía domínio completo,
justamente para que assim fosse obrigado a escrever menos. O autor acreditava
que ao sabermos muito pouco sobre nós mesmos, nada temos a dizer; portanto a
palavra deveria ser reduzida e não deveria comunicar.
Entre 1946 e 1949 escreveu
os grandes romances Molloy, Malone Morre e o Inominável e na
década de 50 inseriu sua narrativa nos palcos teatrais. Em 1953 revoluciona a
linguagem teatral com a original obra Esperado Godot e por meio dela teve
seu trabalho reconhecido internacionalmente.
Samuel Beckett é
considerado um dos principais autores do denominado Teatro
do Absurdo. Vencedor do Prêmio Nobel de Literatura, em 1969, foi um
dos mais importantes escritores modernos.
Suas obras foram traduzidas
em mais de trinta idiomas e apresentam um texto repleto de metáforas e uma
reflexão sobre a condição humana.
Para o autor o ser humano
é “condenado a nascer”. O homem nasce para morrer num mundo cruel e sem
sentido.
Apesar de ateu era um
profundo conhecer da Bíblia. Suas obras refletem o pensamento de um autor
descrente; para quem não crê em Deus e não possui religião o mundo é um lugar
sem respostas e tudo o que se pode obter dele é o eterno silêncio; o silêncio
tão presente nas obras beckettianas.
Este dramaturgo pessimista
e desconcertante escreveu uma série de peças, entre elas Fim de
Jogo, Comédia, Não Eu, a Última Gravação de
Krapp, Ato Sem Palavras, Catástrofe, Caminhando
Decididamente Rumo ao Silêncio e Vai e Vem (sua última peça). Porém,
nenhum destes textos conseguiu causar o impacto fulminante que a
obra Esperando Godot causou (e ainda causa) na platéia e na crítica
literária daquela época.
Samuel Beckett faleceu, em
Paris, em 22 de dezembro de 1989.
A OBRA E O TEATRO
BECKETIANO:
Beckett apresenta em
seus textos uma continuidade estilística única e não admite qualquer concessão à
sua proposta artística. A principal característica de sua obra é a palavra que
não comunica!
Autor
dos importantes ”anti-romances”, no sentido de que são textos que abandonam os
valores romanescos e a convenções, que compõem a trilogia Molloy, Mallone
Morre e o Inominável.
A
obra beckettiana é anti-realista e não defende doutrinas, pelo contrário,
demonstra uma total negação e satirizarão de toda e qualquer regra e certezas
pré-estabelecidas.
A
poética da negação e da redução, presente em Esperando Godot e
característica da obra beckettiana culminaram no minimalismo, existente nos
últimos contos e peças do autor.
O
escritor trabalha com a descaracterização de tudo aquilo que humaniza. Cria
personagens que possuem consciência da sua condição existencial e da morte que
os espera; assim como todos nós também possuímos.
A
questão dos duplos é sempre presente nas criações de Beckett e todos os
seus pares apresentam uma relação de dependência mútua; são temperamentos que se
complementam e apesar das constantes ameaças de separação, seus personagens
jamais abandonam um ao outro como, por exemplo, as personagens Vladimir e
Estragon, Pozzo e Lucky; em Esperando Godot, Hamm e
Clov, Nell e Nag; em Fim de Partida, Molloy e
Moran; em Molloy, entre outros.
“Difíceis e
desconcertantes, drama e prosa do autor de Esperando Godot recusam a acomodação
de suas tensões internas em pares conceituais antípodas como otimismo/pessimismo
ou realismo/absurdo. São formas de expressão pensada e cifrada de impasses
estruturais que vão muito além de seus limites. Também por isso não cabem no
simples comentário explicativo, nem se esgotam na decodificação erudita de suas
referências e intertextos, mesmo que, para tanto, se multiplique, a cada ano, um
exército de
especialistas.”
(Fábio de Souza Andrade)
O
minimalismo presente em sua obra bem como a presente nudez em suas peças
teatrais representa a nudez humana; o homem moderno leva uma vida sem sentido e
angustiante, num mundo hostil e incerto.
As
personagens de Beckett são seres que sobraram na vida e são desprovidas
de memória; quem não tem memória não tem passado e, portanto, não tem referência
e identidade com nada e nem ninguém. Por isso, os objetos de cena são tão
importantes em suas obras, pois aquele que nada possui tende a se apegar a
qualquer objeto que consiga obter; em Esperando Godot, por exemplo, os
mendigos Vladimir e Estragon criam uma profunda relação de
identidade entre os poucos objetos que possuem, principalmente com seus
chapéus.
Beckett quebra a
denominada “quarta parede” do teatro realista, com referências das personagens
ao público que assiste ao espetáculo; uma negação beckettiana às regras e
às convenções do teatro tradicional. Usa personagens clownescos para
amenizar o discurso trágico de suas peças.
A preocupação do
autor não está em mostrar o absurdo da existência a partir da vida social, mas a
de expressar o choque do homem consigo mesmo e extraindo assim, do seu íntimo, a
perplexidade deste encontro.
O
TEMPO NA OBRA DE BECKETT:
O
homem é consciente de que a cada segundo que passa em sua vida ele caminha em
direção ao seu destino final; a morte.
Em Godot, percebemos a passagem do tempo quando a árvore passa a
adquirir folhas e quando as botas já não calçam mais os pés inchados das
personagens. Apesar de não perceber o tempo e não se direcionar no espaço o
mendigo beckettiano, assim como
qualquer outro ser
humano, está sujeito a degradação de seu físico dada pela passagem dos dias e ao
tédio causado pelas horas que passam sem nenhum acontecimento importante. Diante
de tanta inércia e solidão o que lhe resta é esperar que a vida se encarregue da
ação final.
“Ao contrário dos
existencialistas, o romance não está a serviço da demonstração de doutrinas,
muito menos o indivíduo que interessa aparece como uma abstração imutável, uma
essência atemporal. Além da substância histórica, sua prosa apresenta uma
evolução interna ä obra beckettiana que a torna inconfundível, da mesma forma
que suas criaturas”
(Fábio de Souza Andrade- em
Sempre Menos, quase Nada: A Retratação do Espaço no Romance
Beckettiano)
“É uma forma do teatro
moderno que utiliza para a criação do enredo, das personagens e do diálogo
elementos chocantes do ilógico, com o objetivo de reproduzir diretamente o
desatino e a falta de soluções em que estão imersos o homem e sociedade. O
inaugurador desta tendência teria sido Alfred Jerry.
“
O
autor do Teatro do Absurdo não propõe teses e não debate ideologias. Recusa
totalmente as regras do teatro tradicional, apresenta personagens que são
conscientes da sua trágica condição humana e falta de significado de sua
existência e escreve sobre sentimentos de desespero e de angústia, sem a ilusão
da ficção.
“A única
resposta está na experiência direta, e no teatro é possível experimentar a
realidade absoluta da extraordinária presença do vazio, em contraste com a
estéril de uma cabeça entulhada de pensamentos.”
(Peter Brook)
CONCLUSÃO:
A obra
Esperando Godot é o oposto daquilo que o público espera de uma peça
teatral; em Godot nada acontece nada surge e tudo se espera. Beckett
alcançou com esta obra-prima a essência da alma humana, que se encontra
repleta de angústia, de medo, de desespero e de impotência diante de tantas
desilusões.
De
modo cômico e poético expressou o pessimismo, o desconforto e a trágica condição
humana e espelhou em suas personagens a ansiedade, a passividade e a dor
existencial, presentes em todos àqueles que já não encontram saída para o seu
sofrimento e se vêem descrentes e perdidos diante de um mundo hostil e
severo.
Beckett desintegrou todas as regras
teatrais e todos os elementos romanescos. Sua obra não é uma representação do
mundo externo, mas uma expressão dos sofrimentos mais profundos de um homem
inerentemente incapaz de ter consciência plena, de se orientar, de se comunicar
e de agir. Enigmatico e fascinante seu
texto nos conduz a uma profunda reflexão sobre o sentido da vida e sobre os
valores que passamos a cultivar enquanto nos ocupamos em manter a nossa
sobrevivência. A personagem beckettiana é definida pela negação; pela
demonstração nítida e escancarada de aquilo que poderia ter sido e não e que,
portanto consegue despertar no espectador os mais incômodos sentimentos como,
por exemplo, os de impotência e de frustração diante da
vida.
BIBLIOGRAFIA:
· MANZANO, Thais Rodegheri.
Artimanhas da Ficção: Ensaios de Literatura. São Paulo: Editora Terceiro Nome,
2008.
· ANDRADE, Fábio de Souza.
Sempre menos,quase nada: A retratação do espaço no romance Beckettiano. São
Paulo: Cultura Vozes,1996.
· BERRETINI, Célia. A
linguagem de Beckett.São Paulo: Perspectiva, 1977.
· PRADO, Décio de Almeida.
Esperando Godot in teatro e progresso- Crítica Teatral..São Paulo: Editora
Martins Fontes, 1964.
· PEIXOTO, Fernando. Godot
chegou para Beckett in Teatro em questão. São Paulo: Editora Hucitec,
1989.
· ESSLIN, Martin. O Teatro do
Absurdo. Tradução de Bárbara Heliodora. Rio de Janeiro: Editora Jorge
Zahar,1968.
· KENNEDY,
Andrew K. Waiting for Godot and Endgame : Action and theatricality in
Waiting for Godot. London: Editora Macmillan, 1992.
· ESSLIN, Martin. Beckett: a
busca do eu. In: O Teatro do Absurdo. Rio de Janeiro: Editora Jorge
Zahar,1968
· ANDRADE, F.de . Samuel
Beckett: o silêncio possível. São Paulo: Ed. Companhia das Letras,
2005.
· SARTRE, J.P. O Ser e o Nada.
São Paulo: Editora Vozes, 2003.
· ARTAUD, A. O Teatro e seu
Duplo. São Paulo: Editora Martins Fontes, 1999.
Esperando Godot - Dir. Gabriel Vilela- Sesc Paulista (2006)
OBS.: VOCÊ PODE COPIAR ESTE
TEXTO DESDE QUE CITE O AUTOR E O SITE (
http://cenarioartistico.blogspot.com) . ESTE TEXTO É DE AUTORIA DE
MARIANNA F. SANTORO
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